quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Gestão de sala de aula - parte I

Domínio de conteúdo

Chegar em sala com segurança sobre aquilo que vai ensinar. O aluno percebe a insegurança do professor e muita vezes usa isto contra o próprio.

Seja motivado, não precisa de nada mirabolante, mas o que fizer que faça com disposição.

Fazer um estudo prévio sobre o que vai lecionar.

Pesquizar pelo menos uma teoria diferente. A internet permite isso, e há sempre algo novo para se descobrir.

Tirar as dúvidas antes de chegar a sala.

Obs. Participe desta atividade, deixe o seu comentário a respeito do assunto, outras dicas relacionadas a DOMÍNIO DE CONTEÚDO na gestão de sala de aula.Obrigada, até a próxima.

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Capítulo IX - Alice no país das maravilhas

Capítulo 9
A história da falsa tartaruga

"Você não pode imaginar como eu estou feliz em vê-la novamente, minha queridinha", disse a Duquesa, tocando afetuosamente o braço de Alice, passando a caminhar junto com ela.

Alice ficou feliz por encontrá-la de bom humor, e pensou consigo mesma que talvez fosse a pimenta que a deixava tão selvagem como quando as duas se conheceram na cozinha.

"Quando eu for uma Duquesa", ela disse para si mesma ( não em um tom muito esperançoso), "não vou usar pimenta em minha cozinha de jeito nenhum. Sopa cai muito bem sem isso talvez seja a pimenta que deixe as pessoas mal-humoradas", ela continuou, bem feliz de ter descoberto um novo tipo de regra, "e o vinagre as deixa azedas...e a camomila as deixa amargas...e...e as balas de cevada e este tipo de coisas é que deixam as crianças tão doces. Eu queria que as pessoas soubessem disso: então, eles não, seriam tão sovinas com doces, sabe..."

Ela quase se esqueceu da Duquesa nessa hora e levou um pequeno susto quando ouviu sua voz perto dos ouvidos.

"Você está pensando em alguma coisa, minha querida, e isso faz você esquecer de falar. Eu não posso lhe dizer agora qual é a moral disso mas vou lembrar num instante."

"Talvez não haja nenhuma", Alice aventurou-se a observar.

"Ora, ora, criança!", retrucou a Duquesa. "Tudo tem uma moral, se você encontrá-la." E foi se apertando contra Alice enquanto falava.

Alice não gostou muito de estar tão perto dela, em primeiro lugar porque a Duquesa era muito feia, e em segundo lugar porque era do tamanho exato para apoiar o queixo sobre o ombro de Alice, e possuía um queixo muito pontudo. Entretanto, Alice não queria ser rude e por isso agüentou o quanto pôde.

"O jogo parece estar bem melhor agora", disse para manter a conversa.

"Perfeito", respondeu a Duquesa, "e a moral disso é..." Oh!, é o amor, é o amor que faz o mundo girar!"

"Alguém disse", Alice murmurou, "que ele gira quando cada um cuida dos seus próprios negócios."

"Ah! Bem! Isto quer dizer quase a mesma coisa", disse a Duquesa enfiando o queixo pontudo nos ombros de Alice, completando, "e a moral disso é...Tome conta do sentido e os sons tomarão conta de si mesmos."

"Como ela gosta de achar uma moral em tudo!", Alice pensou consigo mesma.

"Aposto como você está pensando porque eu não coloco meu braço na sua cintura", a Duquesa falou, depois de uma pausa. "A razão é: tenho dúvidas em relação ao humor do seu flamingo. Posso experimentar?"

"Ele pode bicar", Alice cautelosamente replicou, não se sentindo nem um pouco a fim de que ela tentasse.

"Bem verdade", disse a Duquesa, "flamingos e a mostarda bicam. E a moral disso é...Pássaros da mesma plumagem voam juntos."

"Só que a mostarda não é um pássaro", Alice observou.

"Certo. Como sempre", disse a Duquesa, "você tem uma maneira muito clara de colocar as coisas!"

"É um mineral, eu acho", disse Alice.

"É claro que é", disse a Duquesa, que parecia pronta para concordar com tudo que Alice dissesse. "Há uma grande máquina de mostarda perto daqui. E a moral disso é...Qaunto mais tenho para mim, menos sobra para os outros."

"Ah!, já sei!", exclamou Alice, que não tinha prestado atenção à última observação da Duquesa. "É um vegetal. Não parece com um mas é."

"Eu concordo com você", disse a Duquesa, "e a moral disso é...Seja o que você parece ser...ou, se você prefere colocar isso de um jeito mais simples...Nunca se imagine diferente do que deveria parecer para os outros o que você fosse ou poderia ter sido não seja diferente do que você tendo sido poderia ter parecido para eles ser diferente."

"Eu acho que poderia entender melhor", disse Alice polidamente, "se eu tivesse isso por escrito: não consigo seguir com você falando."

"Isso não é nada em comparação com o que eu poderia dizer, se quisesse", replicou a Duquesa num tom de prazer.

Por favor, não se dê ao trabalho de dizer isso mais complicado que já disse", falou Alice.

"Oh, não fale em dar trabalho", disse a Duquesa. "Dou-lhe de presente tudo o que já falei até agora."

"Um tipo de presente bem barato!", pensou Alice. "Fico feliz que as pessoas não costumem dar presentes de aniversário como esses!". Mas ela não se aventurou a dizer issso em voz alta.

"Pensando novamente?", perguntou a Duquesa, com outro cutucão do seu queixo pontudo.

"Eu tenho o direito de pensar", disse Alice asperamente começando a se sentir aborrecida.

"Tem tanto direito", disse a Duquesa, "quanto os porcos têm de voar, e a mo..."

Mas nesse instante, para grande surpresa de Alice, a voz da Duquesa sumiu, bem no meio da sua palavra favorita, moral, e o braço que estava grudado no seu começou a tremer. Alice olhou para cima e lá estava a Rainha diante dela, com os braços cruzados, franzindo o cenho como uma tempestade de raios e trovões.

"Um belo dia, não é, Majestade?", a Duquesa começou, com uma vozinha débil, frágil.

"Agora, eu vou lhe dar um aviso sincero", gritou a Rainha, batendo os pés no chão enquanto falava, "ou você ou a sua cabeça devem sair daqui, e já! Faça sua escolha!"
A duquesa fez sua escolha e sumiu no mesmo instante.

"Vamos continuar com o jogo", a Rainha disse para Alice, e a menina estava assustada demais para dizer qualquer coisa, por isso seguiu-a lentamente em direção ao campo de críquete.

Os outros convidados tiraram vantagem com a ausência da Rainha e estavam descansando na sombra: entretanto, tão logo a avistaram correram apressados para o jogo, pois a Rainha tinha reforçado que um minuto sequer de atraso iria lhes custar a vida.

Todo o tempo em que eles estiveram jogando a Rainha não parou nem um minuto de discutir com os jogadores e gritar "Cortem a cabeça dele!", ou "Cortem a cabeça dela!". Aqueles que eram sentenciados ficavam sob custódia dos soldados, que, é claro, tinham que deixar seus postos de arcos do jogo para isso, daí, lá pelo final da primeira meia-hora de jogo, já não havia mais arcos e todos os jogadores, com exceção do Rei, da Rainha e de Alice estavam presos e sob sentença de execução.

Então a Rainha abandonou o jogo, quase sem fôlego e perguntou para Alice: "Você já viu a Falsa Tartaruga?"

"Não", respondeu Alice. "Eu nem mesmo sei quem é a Falsa Tartaruga."

"É com o que se faz a Sopa de Falsa Tartaruga", completou a Rainha.

"Nunca vi uma, nem mesmo ouvi falar", disse Alice.

"Venha, então", disse a Rainha, "e eu vou lhe contar a história dela."

Como todos caminhavam juntos, Alice ouviu o Rei dizer em voz baixa para os condenados: "Vocês estão todos perdoados."

"Bem, isso é uma boa coisa!", Alice disse para si mesma, pois estava se sentindo muito triste com as execuções que a Rainha ordenara.

Logo eles chegaram junto a um Grifo, que jacarezava ao sol. (Se você não sabe o que é um Grifo, olhe a figura)

"Levante-se, preguiçoso!", disse a Rainha. "E leve esta senhorita para ver a Falsa Tartaruga e ouvir sua história. Eu preciso voltar para verificar algumas execuções que ordenei", e afastou-se, deixando Alice sozinha com o Grifo.

Alice não gostou muito do visual da criatura, mas ela pensou que no fim das contas estaria mais a salvo ficando com ele do que seguindo com a selvagem Rainha. Pelo menos era o que esperava.

O Grifo sentou-se e esfregou os olhos, olhando a Rainha até que ela sumisse de vista. Então começou a rir por entre os dentes.

"Qual é a graça?", perguntou Alice.

"Ela", disse o Grifo. "Tudo é fantasia dela. Eles nunca executam ninguém, sabe. Vamos!"

"Todo mundo diz 'vamos' por aqui", pensou Alice , ao mesmo tempo que começou a segui-lo lentamente. "Eu nunca fui tão mandada em toda minha vida antes, nunca!"

Eles ainda não tinham ido muito longe, quando avistaram a Falsa Tartaruga ao longe, sentada triste e solitária sobre a pequena saliência de uma pedra e, ao chegarem mais perto, Alice pôde ouvi-la suspirar como se seu coração estivesse partido. Alice sentiu uma grande pena dela.

"Porque ela está triste?", perguntou ao Grifo. E o Grifo respondeu com quase as mesmas palavras que dissera em relação à Rainha: "É tudo fantasia dela, ela não tem pelo que entristecer, sabe. Vamos!"

Eles foram então na direção da Falsa Tartaruga, que olhou para eles com seus grandes olhos cheios de lágrimas, mas não disse nada.

"Esta jovem", disse o Grifo, "quer saber sua história, quer sim."

"Eu vou lhe contar", disse a Tartaruga, com uma voz profunda, cavernosa. "Sentem-se os dois, e não digam nenhuma palavra até eu terminar."

Então eles sentaram-se e ninguém falou nada por alguns minutos.

Alice pensou consigo mesma. "Eu não sei como ela pode terminar se nem mesmo começa."

Mas esperou pacientemente.

"Uma vez", disse a Falsa Tartaruga afinal, com um suspiro profundo. "Eu era uma Tartaruga de verdade!"

Estas palavras foram seguidas de um grande silêncio, quebrado apenas por uma ocasional exclamação "Hjckrrh!", vindo do Grifo e os constantes e fortes soluços da Falsa Tartaruga. Alice já estava a ponto de levantar e dizer "Obrigada, Senhora, pela sua interessante história", mas ela não podia deixar de pensar que deveria haver mais algo a ser dito e então ficou sentada e não disse nada.

"Quando nós éramos pequenos", a Falsa Tartaruga continuou afinal, mais calmamente, embora ainda soluçando um pouquinho, "íamos para a escola no mar. O professor era uma velha Tartaruga. Nós costumávamos chamá-la Tartenruga (N. da T. - Tortoise é um tipo de tartaruga que vive na terra ou na água doce, enquanto turtle é aquela do mar).

"E por que chamá-la de Tartenruga se ela era uma Tartaruga?", perguntou Alice.

"Nós a chamávamos assim porque tinha rugas", a Falsa Tartaruga respondeu com irritação. "Você é mesmo muito tonta!"

"Você deveria envergonhar-se de fazer uma pergunta tão boba", completou o Grifo, e então os dois sentaram-se e ficaram em silêncio olhando para a pobre Alice, que sentiu-se a ponto de enfiar a cabeça no chão de vergonha. Finalmente o Grifo disse para a Falsa Tartaruga:

"Vai em frente, velha amiga! Não vamos ficar aqui o dia inteiro!".

Ela então prosseguiu:

"Sim, nós íamos para a escola no mar... mas parece que você não acredita mesmo..."

"Eu não disse nada!", interrompeu Alice.

"Disse sim!", retrucou a Falsa Tartaruga.

"Segure sua língua", completou o Grifo, antes que Alice pudesse retrucar. A Falsa Tartaruga continuou:

"Nós tivemos a melhor educação...na verdade, nós íamos à escola diariamente..."

"Eu também ia à escola todos os dias", falou Alice, "você não tem porque ficar orgulhosa disso."

"Com aulas extra?", perguntou a Falsa Tartaruga um pouco ansiosa.

"Sim", respondeu Alice, "nós aprendíamos Francês e música."

"E lavagem?", mais uma vez perguntou a Falsa Tartaruga.

"É claro que não", disse Alice indignadamente.

"Ah! Então a sua escola não era realmente boa", acrescentou a Falsa Tartaruga em um tom de grande alívio. "Agora, na nossa tinha, afinal, 'Francês, música e lavagem'...extra."

"Vocês não precisavam muito disso", retomou Alice, "vivendo no meio do mar."

"Eu não tinha recursos para pagá-los", insistiu a Falsa Tartaruga com um suspiro.

"Eu só freqüentava os cursos regulares."

"E quais eram?" indagou a menina.

"Enrolação e Contorção, é claro, para começar", a Falsa Tartaruga replicou, "e depois os diferentes ramos da Aritmética: Ambição, Distração, Enfeiação e Derrisão."

"Eu nunca ouvi falar em 'Enfeiação'", Alice atreveu-se a dizer. "O que é isso?"

O Grifo levantou as patas em sinal de surpresa. "Nunca ouviu falar em 'Enfeiação'!", exclamou, "Você sabe o que é embelezamento, acredito eu!"

"Sim", respondeu Alice sem muita certeza, "significa...fazer...alguma coisa...mais bonita..."

"Bem, então", o Grifo continuou, "se você não sabe o que é enfeiação, você é muito boba mesmo."

Alice não teve coragem de perguntar mais nada sobre o assunto. Virou-se então para a Falsa Tartaruga e disse:

"O que mais você aprendeu?"

"Bem, havia Mistério", e a Falsa Tartaruga começou a enumerar as matérias nas patas. "Mistério antigo e moderno, com Marografia: também Arrastamento...o professor de Arrastamento era um velho congro, que vinha uma vez por semana. Ele nos ensinava Arrastamento, Esticamento e ainda Desmaios em Bobinas."

"E como é isso?", disse Alice.

"Bem, eu não vou poder mostrar para você", completou a Falsa Tartaruga. "Ando meio fora de forma. E o Grifo não aprendeu isso."

"Não tive tempo", disse o Grifo. "Eu estudei com o mestre das Clássicas. Ele era um velho caranguejo, se era."

"Nunca tive aulas com ele", retomou a Falsa Tartaruga com um suspiro. "Ele ensinava Risando e Desgosto, dizem."

"É isso mesmo, isso mesmo" disse o Grifo, suspirando também. Os dois esconderam as caras nas patas.

"E quantas horas vocês estudavam por dia?", perguntou Alice, apressando-se em mudar de assunto.

"Dez horas no primeiro dia", respondeu a Falsa Tartaruga, "nove no segundo e assim por diante."

"Que coisa estranha!", exclamou Alice.

"É por isso que chamávamos as aulas de lições (lessons)", o Grifo explicou, "porque elas diminuíam (lessen) cada dia."

Aquela era uma idéia nova para Alice, e ela parou para pensar um pouco antes da sua próxima observação. "Então o décimo-primeiro dia tinha que ser feriado?"

"Claro que era", respondeu a Falsa Tartaruga.

"E como era no décimo-segundo?", perguntou com vivacidade Alice.

"Chega de lições", o Grifo interrompeu em um tom decidido. "Conte a ela sobre os jogos agora."

Capítulo VIII - Alice no país das maravilhas

Capítulo 8
O jogo de críquete no campo da rainha

Uma grande roseira imperava na entrada do jardim: as rosas que nela cresciam eram brancas, mas havia três jardineiros que se ocupavam em pintá-las de vermelho. Alice achou que aquilo era uma coisa estranha e aproximou-se para ver melhor. Justamente na hora que chegou perto deles, ouviu um dos jardineiros dizer:

"Cuidado, Cinco! Não jogue tinta em mim!"

"Eu não tive culpa", disse o Cinco em um tom aborrecido. "O Sete empurrou meu cotovelo."

Nisso o Sete olhou para cima e retrucou:

" Muito bem, Cinco! Sempre colocando a culpa nos outros!"

"É melhor você não falar nada!", disse o Cinco. "Ontem mesmo eu ouvi a Rainha dizer que você merecia ser decapitado!"

"Por quê?", disse aquele que tinha falado primeiro.

"Não é de sua conta, Dois!", disse o Sete.

"É sim, é da conta dele!", disse o Cinco. "E eu vou dizer pra ele... é porque você levou raízes de tulipa ao invés de cebolas para a cozinheira."

O Sete jogou o pincel fora, e estava começando a falar "Bem, de todas as injustiças...", quando seus olhos caíram sobre Alice, que os estava observando. Ele calou-se subitamente: os outros olharam ao redor e todos curvaram-se em respeitosa reverência.

"Vocês poderiam dizer-me, por favor", disse Alice , um pouco timidamente, "por que estão pintando estas rosas?"

O Cinco e o Sete não disseram nada, mas olharam para o Dois. O Dois começou, em um tom baixo:

" Porque, de fato, você vê, Senhorita, esta deveria ser uma roseira vermelha, e nós plantamos uma roseira branca por engano, e, se a Rainha descobrir, nós todos seremos decapitados, sabe. Portanto, você vê, Senhorita, estamos fazendo o melhor possível, antes que ela chegue para..."

Neste exato momento, o Cinco, que estivera todo o tempo olhando ansiosamente para o jardim, gritou: "A Rainha! A Rainha!" E os três jardineiros atiraram-se instantaneamente de bruços no chão. Havia o som de muitas passadas, e Alice olhava ao redor, doida para ver a Rainha.

Em primeiro lugar chegaram dez soldados carregando clavas: eles eram todos da mesma forma que os jardineiros, retangulares e achatados, com as mãos e os pés saindo dos quatro cantos; depois vinham dez cortesãos, que eram ornamentados com diamantes e caminhavam de dois em dois, como os soldados. Depois desses vinham as crianças reais, dez delas, e as gracinhas iam saltitando alegremente de mãos dadas, em duplas também. A seguir vinham os convidados, a maior parte de Reis e Rainhas, e entre estes Alice reconheceu o Coelho Branco, falando apressadamente de um jeito nervoso, sorrindo para tudo o que era dito. Ele seguiu sem reconhecer Alice. Finalmente vinha o Valete de Copas, que carregava a coroa do Rei sobre uma almofada de veludo escarlate, antecipando o final do grande cortejo, que trazia O REI E A RAINHA DE COPAS.

Alice estava em dúvida se deveria ou não atirar-se ao chão de bruços como os três jardineiros, mas não conseguia se lembrar se já tinha ouvido falar sobre tal regra em cortejos, "e além disso, qual seria a utilidade de um cortejo", pensou, "se as pessoas ficam de bruços e não podem vê-lo?" Então ela ficou como estava e esperou.

Quando o cortejo passou por Alice, todos pararam e olharam para ela. A Rainha disse, severamente: "Quem é isso?", dirijindo-se ao Valete de Copas, que apenas curvou-se e sorriu em resposta.

"Idiota!", disse a Rainha, balançando a cabeça impacientemente, e, dirigindo-se para Alice, prosseguiu: "Qual é o seu nome, criança?"

"Meu nome é Alice, às suas ordens Majestade", disse Alice bem educadamente, mas acrescentou, para si mesma, "Oras, afinal de contas eles não passam de um baralho de cartas. Eu não preciso ter medo deles!"

"E quem são esses?", perguntou a Rainha, apontando para os três jardineiros que estavam ainda estendidos ao lado da roseira. Isso porque, vocês sabem, como eles estavam de bruços e a parte de trás do baralho era igual a todo o resto do baralho, ela não poderia dizer se eles eram jardineiros, ou soldados, ou cortesãos ou três das crianças reais.

"Como é que eu poderia saber?", disse Alice surpreendida por sua coragem. "Não é da minha conta."

A Rainha ficou vermelha de raiva e depois de encará-la por um momento como uma fera selvagem, começou a gritar: "Cortem-lhe a cabeça! Cortem-lhe..."

"Besteira!", retrucou Alice, em tom alto e decidido, e a Rainha calou-se.

O Rei pousou sua mão sobre o braço da esposa e disse timidamente:

"Deixe pra lá, minha querida: ela é apenas uma criança!"

A Rainha afastou-se dele com raiva e disse para o Valete:

"Vire-os!"

O Valete os virou, muito delicadamente, com um pé.

"Levantem-se!", disse a Rainha com uma voz estridente e alta, e os três jardineiros instantaneamente saltaram e começaram a fazer reverências para o Rei, a Rainha, as crinças reais e todo o resto do pessoal.

"Parem com isso", gritou a Rainha. "Vocês me deixam tonta." Então, virando-se para a roseira, ela continuou falando: "O que vocês estavam fazendo aqui?"

"Para servir à Sua Majestade", disse o Dois, humildemente, ficando sobre um joelho enquanto falava, "nós estávamos tentando..."

"Eu entendo!", disse a Rainha, enquanto examinava as rosas. "Cortem-lhe as cabeças!" e o cortejo prosseguiu, com três dos soldados ficando para trás para executar os desafortunados jardineiros, que correram na direção de Alice em busca de proteção.

"Vocês não serão decapitados!", disse Alice, colocando-os dentro de um grande jarro de flores que estava por perto. Os três soldados ficaram confusos por um minuto ou dois, procurando por eles e então voltaram para o final do cortejo.

"As cabeças já foram cortadas?", berrou a Rainha.

"Suas cabeças se foram, para servi-la, Majestade!"", os soldados gritaram em resposta.

"Muito bem!", gritou a Rainha. "Você sabe jogar críquete?"

Os soldados permaneceram em silêncio e olharam para Alice, pois a pergunta era evidentemente dirigida a ela.

"Sim!", gritou Alice.

"Então venha", rugiu a Rainha e Alice juntou-se ao cortejo, doida para saber o que aconteceria a seguir.

"É um...é um belo dia!" disse uma vozinha tímida ao seu lado. Ela estava caminhando bem ao lado do Coelho Branco, que ficava olhando o tempo todo para ela.

"Muito", disse Alice. "Onde está a Duquesa?"

"Psiu!Psiu!", disse o Coelho em voz baixa, assustado. Ele olhava ansiosamente por sobre os ombros enquanto falava e então ergueu-se na ponta das patinhas, colocando a boca bem perto dos ouvidos de Alice e cochichou: "Ela foi condenada."

"A que pena?" perguntou Alice.

"Você disse Que pena!?", o Coelho perguntou.

"Não, eu não disse", retrucou Alice. "Não acho que seja uma pena. Eu disse A que pena?!"

"Ela deu um murro nos ouvidos da Rainha...", o Coelho começou a contar. Alice disparou a rir. "Oh, psiu!", o Coelho murmurou em um tom assustado. "A Rainha irá ouvi-la! Mas você entende, a Duquesa chegou muito tarde e a Rainha falou..."

"Tomem seus lugares!", gritou a Rainha em uma voz de trovão, e as pessoas começaram a correr em todas as direções, batendo umas nas outras. Entretanto, em um minuto ou dois estavam todos em seus lugares e o jogo começou.

Alice pensou que ela nunca em sua vida vira um campo de críquete tão curioso: ele era todo cheio de saliências e sulcos, as bolas de críquete eram ouriços vivos e os tacos eram flamingos também vivos. Os soldados curvavam-se e colocavam as mãos no chão para fazer os arcos do jogo.

A principal dificuldade que Alice encontrou no início foi como segurar seu flamingo: ela poderia manter o corpo dele sob seu braço com razoável conforto, com as pernas da ave penduradas. Mas, geralmente quando conseguia esticar o pescoço do flamingo e ia fazê-lo chutar o ouriço com a cabeça, ele virava-se e olhava para Alice com uma expressão tão confusa que ela não conseguia parar de rir. Depois, quando desvirava a cabeça dele e se preparava para começar tudo de novo, era irritante perceber que o ouriço tinha se desenroscado e fugia. Além disso, sempre havia uma saliência ou sulco no caminho em que ela queria mandar o ouriço e os soldados-arcos estavam sempre se levantando e mudando de lugar. Alice logo chegou à conclusão que aquele era realmente um jogo muito difícil.

Os jogadores jogavam todos ao mesmo tempo, sem esperar sua vez, discutindo o tempo todo, brigando pelos ouriços; logo a Rainha estava furiosa e batia com os pés no chão, gritando: "Cortem a cabeça dele!", ou "Cortem a cabeça dela!" o tempo todo.

Alice começou a sentir-se muito mal: para dizer a verdade, ela ainda não tinha discutido nenhuma vez com a Rainha no jogo mas sabia que poderia acontecer a qualquer minuto, "e então", ela pensou, "o que irá acontecer comigo? Eles são loucos para cortar as cabeças por aqui. A grande dúvida é como ainda existe alguém vivo!"

Ela estava procurando alguma maneira de escapar, imaginando se daria para fugir sem ser vista quando percebeu uma curiosa aparição no ar: aquilo a confundiu muito no início, mas depois de olhar por um minuto ou dois percebeu que era um sorriso e ela dise para si mesma: "É o Gato de Cheshire: agora eu tenho alguém com quem falar."

"Como você está se saindo?", perguntou o Gato, tão logo ele teve boca o suficiente para falar.

Alice esperou até que seus olhos surgissem e então cumprimentou-o com a cabeça.

"Não adianta falar com ele", ela pensou, "até que suas orelhas apareçam, ao menos uma delas. "Em um minuto toda a cabeça apareceu e então Alice colocou seu flamingo no chão e começou a comentar o jogo, sentindo-se muito feliz por ter alguém para ouvi-la. O Gato parecia achar que já havia parte suficiente sua aparente e nada mais surgiu.

"Eu não acho que eles joguem de maneira muito certa", Alice começou em um tom de queixa, "e discutem de um jeito tão maluco que você não consegue ouvir ninguém falar...e parece que eles não têm nenhuma regra. Finalmente, se têm, ninguém parece respeitar...você não faz idéia de como é confuso jogar com todas essas coisas vivas. Por exemplo, o arco sob o qual deveria passar minha bola mudou-se para o outro lado do campo...e quando eu deveria atingir o ouriço da Rainha agora há pouco, ele saiu correndo ao ver o meu se aproximando!"

"O que é que você acha da Rainha?", perguntou o Gato em uma voz baixa.

"Nada em especial", respondeu Alice, "ela é tão extremamente..." Exatamente neste instante ela percebeu que a Rainha estava bem ao seu lado, ouvindo, "...boa nesse jogo que vai ser muito difícil chegar ao final da partida."

A Rainha sorriu e seguiu em frente.

"Com quem você está falando?", perguntou o Rei, vindo em direção de Alice e olhando para a cabeça do Gato com muita curiosidade.

"É um amigo meu...o Gato de Cheshire", respondeu Alice. "Deixe-me apresentá-lo."

"Eu não gosto do jeito dele", disse o Rei. "Entretanto ele pode beijar minha mão, se quiser."

"Eu prefiro não beijar", o Gato retrucou.

"Não seja impertinente", disse o Rei, "e não me olhe dessa maneira!", escondendo-se atrás de Alice enquanto falava.

"Um gato pode olhar para um rei", disse Alice. "Eu já li isso em algum livro, mas não me recordo qual."

"Bem, ele tem que retirar-se daí", disse o Rei decidido, e chamou a Rainha, que passava por ali naquele momento: "Minha querida! Eu gostaria que você mandasse retirar esse gato daqui!"

A Rainha só tinha uma maneira de remover todas as dificuldades, grandes ou pequenas. "Cortem-lhe a cabeça!", ela ordenou sem nem mesmo olhar para os lados.
"Eu mesmo vou buscar o carrasco", disse o Rei impacientemente e apressou-se.

Alice pensou que seria melhor voltar e ver como andava a partida, quando ouviu ao longe a voz da Rainha gritando enlouquecidamente. Ela já ouvira por três vezes a sentença de execução para jogadores que tinham perdido sua vez e não estava gostando nada disso, pois com o jogo confuso como estava ela nunca sabia se era sua vez ou não de jogar. Daí, ela saiu procurando seu ouriço.

O ouriço estava engalfinhado com outro ouriço, o que pareceu para Alice uma excelente oportunidade para atirar um contra o outro: a única dificuldade foi que o seu flamingo tinha corrido para o outro canto do campo, onde Alice podia vê-lo tentando, sem grandes resultados, levantar vôo até uma árvore.

Quando finalmente ela conseguiu apanhar o flamingo e trazê-lo novamente de volta, a luta entre os ouriços tinha terminado e os dois animais tinham sumido: "Mas isso não importa", Alice pensou, "pois todos os arcos se foram desse lado do campo." Então ela novamente colocou o flamingo debaixo do braço para que ele não escapasse novamente, e voltou para conversar um pouquinho mais com seu amigo.

Quando ela voltou para onde estava o Gato de Cheshire, surpreendeu-se com uma multidão ao seu redor: havia uma discussão entre o carrasco, o Rei e a Rainha, todos falando ao mesmo tempo, enquanto o resto permanecia em silêncio, parecendo bastante constrangidos.

No momento em que Alice apareceu, foi chamada pelos três para decidir a questão. Eles repetiram seus argumentos, mas, como todos falavam ao mesmo tempo, ela achou muito difícil entender exatamente o que diziam.

O carrasco argumentava que não se pode cortar uma cabeça ao menos que ela não esteja presa a um corpo. Que ele nunca fizera uma coisa dessas na vida e não seria desta vez que ele começaria.

O Rei argumentava que qualquer coisa que tivesse cabeça poderia ser decapitada, e que aquela conversa era besteira.

A Rainha argumentava que, se alguma coisa não fosse feita rapidamente, ela iria mandar executar todo mundo em volta. (Esta última observação é que deixara o grupo com aquele tom sério e ansioso.)

Alice não encontrou nada melhor para dizer que "Ele pertence à Duquesa: seria melhor perguntar para ela sobre isso."

"Ela está na prisão", a Rainha disse ao carrasco. "Vá buscá-la." E o carrasco saiu disparado como uma flecha.

A cabeça do Gato começou a desaparecer bem no momento em que ele se foi e na hora que o carrasco voltou com a Duquesa já tinha sumido totalmente. O Rei e o carrasco começaram a procurá-lo desesperadamente por todo lado, enquanto o restante do grupo voltou ao jogo.

Capítulo VII - Alice no país das maravilhas

Capítulo 7
Um chá maluco

Havia uma mesa arrumada embaixo de uma árvore, em frente à casa, e a Lebre de Março e o Chapeleiro estavam tomando chá; um Leirão estava sentado entre os dois, dormindo profundamente, e os outros dois o usavam como almofada, descansando sobre ele e conversando sobre sua cabeça. "Muito desconfortável para o Leirão", pensou Alice, "mas já que ele está dormindo, acho que não se importa."

A mesa era bem grande, mas os três amontoavam-se num canto. "Não tem lugar! Não tem lugar!", eles gritaram ao ver Alice chegando."Tem muito lugar!", disse Alice com indignação, e sentou-se em uma grande poltrona numa das cabeceiras da mesa.

"Tome um pouco de vinho", a Lebre de Março ofereceu em um tom encorajador.

Alice olhou ao redor por sobre a mesa e não havia nada senão chá.

"Eu não vejo nenhum vinho", ela observou.

"Não tem nenhum mesmo", retrucou a Lebre de Março.

"Então não é muito educado de sua parte oferecer", respondeu Alice com raiva.

"E não é muito educado de sua parte sentar-se sem ser convidada", disse a Lebre de Março.

"Eu não sabia que era sua mesa", insistiu Alice, "ela está arrumada para muito mais que três convidados."

"Seu cabelo está precisando ser cortado", disse o Chapeleiro. Ele estivera olhando para Alice por algum tempo com grande curiosidade e esta fora sua primeira intervenção.

"Você deveria aprender a não fazer esse tipo de comentário pessoal", Alice retrucou com severidade. "Isso é muito grosseiro."

O Chapeleiro arregalou os olhos ao ouvir isso, mas, tudo que ele disse foi: " Por que um corvo se parece com uma escrivaninha?"

"Legal, vamos ter diversão agora!", pensou Alice. "Fico feliz que ele tenha começado a propor charadas - acho que posso adivinhar essa", ela completou em voz alta.

"Você acha que pode encontrar a resposta dessa?" perguntou a Lebre de Março.

"Exatamente", respondeu Alice.

"Então você pode dizer o que acha", a Lebre de Março continuou.

"E vou", Alice replicou rapidamente, "pelo menos- pelo menos, eu acho o que digo - o que é a mesma coisa, você sabe."

"Não é a mesma coisa nem um pouco!", disse o Chapeleiro. "Senão você também poderia dizer", completou a Lebre de Março, "que 'Eu gosto daquilo que tenho' é a mesma coisa que 'Eu tenho aquilo que gosto.'"

"Seria o mesmo que dizer", interrompeu o Leirão, que parecia estar falando enquanto dormia, "que 'Eu respiro enquanto durmo' é a mesma coisa que 'Eu durmo enquanto respiro!'"

"Isso é a mesma coisa para você", disse o Chapeleiro, e nesse ponto a conversa parou e a reunião ficou em silêncio por um minuto. Enquanto isso Alice tentava lembrar tudo que ela sabia sobre corvos e escrivaninhas, que não era muito.

O Chapeleiro foi o primeiro a quebrar o silêncio. "Que dia do mês é hoje?", perguntou, virando-se para Alice: ele tinha tirado seu relógio do bolso e olhava para ele ansiosamente, chacoalhando-o de vez em quando e levantando-o no ar.

Alice pensou um pouco e então falou: "É dia quatro."

"Dois dias errado", suspirou o Chapeleiro. "Eu falei pra você que a manteiga não ia adiantar nada", ele completou, olhando raivosamente para a Lebre de Março.

"Era a melhor manteiga", a Lebre de Março replicou mansamente.

"Sim, mas algumas migalhas devem ter caído", o Chapeleiro rosnou. "Você não deveria ter passado com uma faca de pão."

A Lebre de Março apanhou o relógio e olhou para ele melancolicamente; então afundou-o na sua xícara de chá, e olhou novamente para ele: mas parecia que não encontrava nada melhor para dizer que o que já dissera: "Era a melhor manteiga, você sabe."

Alice estivera olhando por cima dos ombros com curiosidade. "Que relógio engraçado!", ela observou. "Ele diz o dia do mês e não diz a hora!"

"Porque deveria?", resmungou o Chapeleiro."Por acaso o seu relógio diz o ano que é?"

"É claro que não", Alice replicou rapidamente, "mas é porque o ano permanece por muito tempo o mesmo."

"Este é exatamente o caso do meu", disse o Chapeleiro.

Alice sentiu-se terrivelmente perturbada. O comentário do Chapeleiro parecia para a menina completamente sem sentido, e ainda assim era inglês. "Eu não estou entendendo nada", ela disse, o mais educadamente que pôde.

"O Leirão está dormindo novamente", disse o Chapeleiro, e despejou um pouco de chá quente sobre seu nariz.

O Leirão balançou a cabeça impacientemente e disse, sem abrir os olhos: "É claro, é claro, é justamente o que eu ia dizer."

"Você já adivinhou a charada?", perguntou o Chapeleiro, virando-se novamente para Alice.

"Não, eu desisto", Alice respondeu. "Qual é a solução?"

"Eu não tenho a mínima idéia", disse o Chapeleiro.

"Nem eu", disse a Lebre de Março.

Alice suspirou enfastiadamente. "Eu acho que você deveria fazer coisa melhor com seu tempo", ela disse, "ao invés de gastá-lo com charadas que não têm resposta."

"Se você conhecesse o Tempo tão bem quanto eu conheço", o Chapeleiro falou, "não falaria em gastá-lo como se fosse uma coisa. Ele é uma pessoa."

"Eu não sei o que você está dizendo", disse Alice.

"Claro que não!", o Chapeleiro disse, sacudindo a cabeça desdenhosamente. "É muito provável que você nunca tenha falado com o Tempo!"

"Talvez não", Alice replicou cautelosamente, "mas eu sei que tenho que marcar o tempo quando aprendo música."

"Ah! Isso explica", concluiu o Chapeleiro. "Ele não vai ficar marcando compasso para você. Agora, se você ficar numa boa com ele, poderá fazer o que quiser com o relógio. Por exemplo, suponha que são nove horas da manhã, bem a hora de começar a fazer as lições de casa, você apenas tem que insinuar no ouvido do Tempo e o ponteiro dá uma virada num piscar de olhos! Uma e meia, hora do almoço!"

("Eu queria que fosse", a Lebre de Março disse para si mesma num sussurro.)

"Isso seria ótimo, com certeza", disse Alice pensativamente; "mas então...eu poderia ainda não estar com fome, você sabe."

"A princípio não, talvez", retomou o Chapeleiro, "mas você poderia ficar na uma e meia da tarde tanto tempo quanto você quisesse."

"É assim que você faz?", perguntou Alice.

O Chapeleiro balançou a cabeça com ar de lamento. "Eu não", ele replicou. "Eu e o Tempo tivemos uma disputa março passado...um pouco antes dela enlouquecer, você sabe..."( apontando a Lebre de Março com a colher de chá)"...foi no grande concerto dado pela Rainha de Copas e eu tinha que cantar

Pisca, pisca, pequeno morcego!
Como eu queria saber onde você está!
"Você conhece a canção, por acaso?"
"Já ouvi alguma coisa parecida", disse Alice.
"Ela continua, você sabe", o Chapeleiro prosseguiu, "dessa maneira:
Muito acima do mundo você voa,
Parece uma bandeja de chá no céu,
Pisca, pisca...

Nesse instante o Leirão estremeceu e começou a cantar dormindo "Pisca, pisca, pisca, pisca..." e continuou repetindo tantas vezes a palavras que tiveram que lhe dar um beliscão para que ele parasse.

"Bem eu mal tinha acabado de cantar o primeiro verso", disse o Chapeleiro, "quando a Rainha berrou 'Ele está matando o tempo! Cortem-lhe a cabeça!'"

"Que selvageria", exclamou Alice.

"E desde então", o Chapeleiro continuou num tom de lamento, "ele não faz nada do que eu peço! É sempre seis da tarde agora!"

Uma idéia brilhante veio à mente de Alice. "Esta é a razão de tantas coisas para o chá colocadas na mesa?" ela perguntou.

"É, é isso", respondeu o Chapeleiro com um suspiro, "é sempre hora do chá, e nós não temos tempo de lavar as coisas entre um chá e outro."

"Então vocês ficam rodando em volta da mesa, não é?", disse Alice.

"Exatamente", disse o Chapeleiro, "à medida que as coisas vão ficando sujas."

"Mas o que acontece quando vocês chegam ao início outra vez?", Alice aventurou-se a perguntar.

"Eu proponho que mudemos de assunto", a Lebre de Março interrompeu, bocejando.

"Estou ficando cansada disso. Eu voto para que a jovem senhorita conte-nos uma história."

"Eu temo que não conheço nenhuma", disse Alice, um pouco alarmada com a proposta.

"Então o Leirão contará!", os outros dois gritaram."Acorde, Leirão!" E beliscaram-no dos dois lados.

O Leirão abriu os olhos lentamente. "Eu não estava dormindo", ele falou numa voz rouca,fraquinha, "eu ouvi cada palavra que meus amigos falavam."

"Conte-nos uma história!", disse a Lebre de Março.

"Sim, por favor!, implorou Alice.

"E seja rápido", completou o Chapeleiro, "ou você poderá dormir novamente antes de acabar."

"Era uma vez três irmãzinhas", ele começou apressadamente, "e seus nomes eram Elsie, Lacie e Tillie, e elas viviam no fundo de um poço..."

"E o que elas comiam?", perguntou Alice, que sempre se interessava pelas questões sobre comida e bebida.

"Elas comiam melado", respondeu o Leirão, depois de pensar por um minuto ou dois.

"Elas não poderiam viver só de melado, você sabe", Alice observou gentilmente.

"Elas ficariam doentes."

"E ficaram", disse o Leirão,"muito doentes."

Alice tentou um pouquinho imaginar quão extraordinário seria este modo de vida, mas ficou muito confusa e assim, continuou: "Mas porque elas viviam no fundo de um poço?"

"Tome mais um pouco de chá", ofereceu a Lebre de Março para Alice, com um ar sério.

"Mas eu ainda não tomei nada", replicou Alice em um tom ofendido, "portanto eu não posso tomar mais."

"Você quer dizer que não pode tomar menos", disse o Chapeleiro, "é mais fácil tomar mais do que nada."

"Ninguém perguntou sua opinião", disse Alice.

"Quem está fazendo observações pessoais agora?", o Chapeleiro perguntou triunfalmente.

Alice não tinha o que responder no momento, daí, aproveitou para tomar um pouco de chá com torradas. Virou-se então para o Leirão e repetiu sua pergunta: "Porque elas viviam no fundo de um poço?"

Mais uma vez o Leirão demorou um minuto ou dois para responder e então disse: "Era um poço de melado."

"Isso não existe!", Alice estava ficando muito brava, mas o Chapeleiro e a Lebre de Março começaram a fazer psiu e o Leirão com um ar amuado observou: "Se você não consegue se comportar civilizadamente, é melhor que acabe a história por conta própria."

"Não, por favor, continue!", disse Alice humildemente. "Eu não vou mais interromper. É muito provável que existe mesmo um poço assim."

"Um, certamente!", retomou o Leirão indignadamente. Entretanto, ele continuou. "Bem, daí as três irmãzinhas...elas estavam aprendendo a extrair, sabe..."

"O que elas extraíam?", perguntou Alice, já esquecendo da promessa.

"Melado", respondeu o Leirão, sem levar em conta a quebra da promessa, dessa vez.

"Eu quero uma xícara limpa", interrompeu o Chapeleiro, "vamos mudar de lugar."

Ele avançou um lugar enquanto falava, e o Leirão o seguiu, a Lebre de Março ficou no seu lugar e Alice com má vontade ficou com o lugar da Lebre de Março. O Chapeleiro foi o único que ficou com a xícara limpa e Alice ficou em um lugar bem pior do que estava antes, pois a Lebre de Março tinha acabado de derramar leite no prato.

Alice não queria ofender o Leirão novamente, por isso começou a falar com cautela:

"Mas eu não entendi. De onde elas extraíam o melado?"

"Você pode extrair água de um poço de água", disse o Chapeleiro, "portanto eu acho que pode extrair melado de um poço de melado, não é, imbecil?"

"Mas elas estavam dentro do poço", Alice disse para o Leirão, como se não tivesse ouvido o último comentário.

"É claro que estavam", respondeu o Leirão, "bem no fundo".

Esta resposta confundiu de tal forma a pobre Alice, que ela deixou o Leirão prosseguir por algum tempo sem interrompê-lo.

"Elas estavam aprendendo a extrair", continuou o Leirão, bocejando e esfregando os olhos, pois estava ficando com muito sono, "e elas extraíam todo tipo de coisas...tudo o que começava com M..."

"Por que com M?", disse Alice.

"Por que não?" respondeu a Lebre de Março.

Alice ficou em silêncio.

O Leirão aproveitou para fechar os olhos e já estava começando a cochilar, mas, ao ser beliscado pelo Chapeleiro, acordou novamente com um gritinho e continuou, "...que começava com M, como mouse-traps(ratoeira) e moon(lua) e memory(memória, lembranças) e muchness( advérbio de intensidade)... você sabe, quando você diz que as coisas são um monte de muitão... você já pensou nisso como um extração de muitão?"

"Realmente, agora que você me pergunta", disse Alice, bem confusa, "eu acho que não..."

"Então você não deveria falar nada", disse o Chapeleiro.

"Esse tipo de grosseria era mais do que Alice conseguia suportar: ela levantou-se muito brava e foi saindo. O Leirão caiu no sono imediatamente e nenhum dos outros dois deu a mínima para sua saída, embora ela tenha olhado para trás uma ou duas vezes, meio que querendo que eles a chamassem. A última vez que Alice os avistou eles estavam tentando enfiar o Leirão dentro do bule de chá.

"Eu não volto lá de jeito nenhum!", disse Alice, enquanto abria caminho em direção à floresta. "Foi o mais estúpido chá do qual participei em toda minha vida!"

Ao dizer isso ela percebeu que uma das árvores tinha uma porta que dava para seu interior. "Que curioso!", ela pensou. "Mas tudo está tão curioso hoje. Eu acho que posso muito bem entrar nessa árvore." E entrou.

Uma vez mais ela encontrou-se naquela sala comprida e com a pequena mesa de vidro. "Desta vez já sei como fazer", ela disse para si mesma, e começou por apanhar a pequena chave dourada, depois abriu a porta que dava para o jardim. Só então ela começou a mordiscar o cogumelo (que ela mantivera em seu bolso) até que estivesse com mais ou menos 30 centímetros de altura: daí ela atravessou a pequena passagem e então ... ela estava em um lindo jardim entre canteiros de flores resplandecentes e fontes de água fresca.

Capítulo VI - Alice no país das maravilhas

Capítulo 6
Porco e pimenta

Por um minuto ou dois Alice parou olhando para a casa, tentando imaginar o que fazer a seguir, quando repentinamente um lacaio vestido com libré apareceu correndo vindo da direção da floresta - (ela considerou que ele era um lacaio porque vestia um libré; por outro lado, julgando apenas pelo seu rosto, poderia chamá-lo de peixe)- e bateu com estardalhaço na porta com os nós dos dedos. Quem abriu foi outro lacaio de libré, com uma cara bem redonda, e olhos grandes como um sapo; e ambos os lacaios, Alice notou, tinham os cachos dos cabelos empoados. Ela estava muito curiosa para saber o que se passava e rastejou para fora da floresta para ouvir.

O Peixe-Lacaio começou por retirar por debaixo do braço uma enorme carta, quase tão grande como ele mesmo, e a estendeu para o outro, dizendo, num tom solene: "Para a Duquesa. Um convite da Rainha para jogar críquete." O Sapo-Lacaio repetiu, no mesmo tom solene, apenas mudando a ordem das palavras um pouquinho: "Da Rainha. Um convite para a Duquesa jogar críquete."

Então, ambos fizeram uma reverência, e seus cachos embaraçaram-se.

Alice riu tanto disso, que teve que correr de volta para a floresta de medo que eles a tivessem ouvido; e, quando ela espiou novamente, o Peixe-Lacaio já tinha ido embora e o outro estava sentado no chão perto da porta, olhando fixo estupidamente para o céu.

Alice dirigiu-se timidamente até a porta, e bateu.

"Não adianta nada bater", disse o Lacaio, "e por dois motivos. Primeiro, porque estou no mesmo lado da porta que você, segundo, porque eles estão fazendo muito barulho lá dentro, ninguém vai ouvi-la.

E certamente havia um barulho muito extraordinário acontecendo lá - constantes uivos e espirros e de vez em quando um enorme barulho de coisa quebrando, como se um prato ou um chaleira estivesse sendo quebrada em pedacinhos.

"Por favor, então", disse Alice, "como eu posso entrar?"

"Haveria alguma razão em você bater na porta", o Lacaio continuou, sem dar importância a Alice, "se houvesse uma porta entre nós. Por exemplo, se você estivesse dentro, você poderia bater, e eu poderia deixar você sair, certo?" Ele olhava para o céu durante todo o tempo que falava, e isso Alice achou decisivamente grosseiro.

"Mas talvez ele não possa evitar", a menina disse para si mesma," seus olhos são tão perto do fim da cabeça. Mas de qualquer maneira ele poderia responder as perguntas. Como eu posso entrar?", ela repetiu em voz alta.

"Eu tenho que ficar aqui", o Lacaio retomou, "até amanhã."

Neste momento a porta da casa abriu-se e um prato grande veio voando diretamente até o nariz do Lacaio, machucando seu nariz e terminando por quebrar-se em mil pedaços contra uma das árvores atrás dele.

"...ou no outro dia, talvez", o Lacaio continuou no mesmo tom, como se nada tivesse acontecido.

"Como eu posso entrar?", perguntou mais uma vez Alice, mais alto ainda.

"Você ainda quer entrar?", disse o Lacaio. "Esta é a primeira pergunta, você sabe."

Isso era, sem dúvida: apenas Alice não gostou que lhe dissessem isso. "É realmente espantoso", murmurou para si mesma, "a maneira com que essas criaturas falam. É o suficiente para deixar qualquer um maluco!"

O Lacaio parecia pensar que aquela seria uma boa oportunidade de repetir sua fala, com variações. "Eu devo sentar aqui", disse ele, "de vez em quando, por dias e dias".

"Mas o que eu posso fazer?" disse Alice.

"Nada que você goste", disse o Lacaio e começou a assoviar.

"Oh, não adianta falar com ele," disse Alice desesperadamente, "ele é completamente idiota!" Ela então abriu a porta e entrou.

A porta dava diretamente para uma grande cozinha, que estava cheia de fumaça de um lado ao outro: a Duquesa estava sentada num tamborete de três pernas bem no meio, embalando um bebê. A cozinheira estava inclinada sobre o fogo, mexendo um enorme caldeirão que parecia estar cheio de sopa.

"Certamente temos muita pimenta na sopa!", Alice disse para si mesma,ao mesmo tempo que espirrava.

Havia certamente muita pimenta no ar. Mesmo a Duquesa espirrava ocasionalmente; o mesmo acontecia com o bebê, que espirrava e uivava alternadamente, sem um momento de pausa. As únicas duas criaturas na cozinha que não espirravam eram a cozinheira e um grande gato, que estava deitado no centro e sorria de orelha a orelha.

"Por favor, a senhora poderia me dizer", perguntou Alice timidamente, pois não estava muito certa se era educado falar primeiro, "porque seu gato sorri desse jeito?"

"Porque ele é um Gato de Cheshire", respondeu a Duquesa,"é por isso. Porco!"

Ela pronunciou a última palavra com tanta violência que Alice deu um pulo; mas ela percebeu no instante seguinte que o chamado era dirigido ao bebê, e não a ela, então armou-se de coragem e tentou novamente:

"Eu não sabia que os gatos de Cheshire sempre sorriam, de fato, eu nunca soube que gatos pudessem sorrir.

"Todos eles podem", afirmou a Duquesa, "e muitos deles o fazem.

"Eu não conheço nenhum", disse Alice muito polidamente, sentindo-se agradecida por ter conseguido iniciar uma conversa.

"Você não sabe muito",disse a Duquesa, "e isso é um fato."

Alice não gostou do tom da voz da Duquesa, e pensou que seria melhor introduzir um outro tema de conversa. Enquanto ela tentava encontrar um, a cozinheira tirou o caldeirão de sopa do fogo e começou a atirar sobre a Duquesa e o bebê todos os objetos que via pela frente - os atiçadores de fogo vieram primeiro, depois uma chuvarada de panelas de molho, pratos e louças. A Duquesa não ligava para nada, mesmo quando um dos utensílios a atingia: e o bebê estava uivando tanto, que era impossível dizer se os projéteis machucavam ou não.

"Oh, por favor, veja o que a senhora está fazendo!", gritou Alice, pulando de um lado para outro com agonia e terror. "Oh, lá vai seu precioso nariz" pois um enorme caçarola voou bem perto do bebê, e por muito pouco não o carregou.

"Se cada um se preocupasse com seus próprios negócios", disse a Duquesa, rosnando roucamente, "o mundo giraria mais rápido do que gira."

"O que não seria uma vantagem", respondeu Alice, que sentia-se muito feliz pela oportunidade de mostrar um pouco do seu conhecimento. "Eu fico pensando que trabalho deve ser fazer o dia e a noite! A senhora vê, a terra leva vinte e quatro horas para girar em torno do seu eixo..."

"Falando em eixos", disse a Duquesa, "cortem a cabeça dela!"

Alice olhou de soslaio ansiosamente para a cozinheira, para ver se ela iria seguir a sugestão; mas a cozinheira estava muito ocupada emxendo a sopa e parecia não ouvir nada; então, ela continuou: "Vinte e quatro horas, eu acho, ou seriam vinte? Eu..."

"Ora, não me amole", falou a Duquesa,"eu nunca tolerei números!" E começou a embalar o bebê novamente, cantando um tipo de canção de ninar, dando no bebê um violento chacoalhão ao final de cada linha:

Fala bruto com o bebezinho
Dá-lhe firme quando ele espirra
Sem dó torce-lhe o focinho
Ele faz isso só de birra.
Coro (com a cozinheira e o bebê)
Urra! Urra! Urra!
Enquanto a Duquesa cantava o segundo verso da canção, ela começou a balançar violentamente o bebê para cima e para baixo, e a pobre coisiva berrava tanto que Alice quase não conseguia ouvir as palavras:
Fala bruto com seu bebê
Bate nele quando espirra
Ele só quer encher a paciência
Porque é mesmo um chatinho!
Falo bruto com meu menino
Bato nele quando espirra
Torço bem seu nariz
Ele adora uma pimentinha!

"Tome aqui! Você pode embalá-lo um pouco se quiser!" a Duquesa disse para Alice, arremessando o bebê para ela enquanto falava. "Eu preciso estar pronta para jogar críquete com a Rainha", e apressou-se para fora da cozinha. A cozinheira atirou contra ela uma frigideira com óleo fervente, mas não conseguiu atingi-la.

Alice apanhou o bebê com alguma dificuldade, pois a pequena criatura tinha uma forma estranha, esticando seus braços e pernas para todas as direções, "como uma estrela do mar" pensou Alice. A pobre pequena coisinha bufava como uma máquina a vapor quando ela o pegou, e continou se retorcendo e se esticando e se dobrando todo o tempo, de modos que, no primeiro minuto ou dois, isso foi o muito que ela poderia fazer para segurá-lo.

Tão logo ela pôde compreender a maneira correta de embalar o bebê ( que consistia em enrolá-lo em uma espécie de nó bem apertado entre sua orelha direita e seu pé esquerdo, para impedir que ele se desatasse). "Se eu não afastar esta criança de mim", pensou Alice,"tenho certeza que vou acabá-la matando em um dia ou dois. Não seria um crime deixá-la aqui?"

Ela falou as últimas palavras em voz alta, e a pequena coisinha grunhiu em resposta (ela já tinha parado de espirrar). "Não grunha", disse Alice. "Não é uma maneira muito apropriada de se expressar."

O bebê grunhiu novamente e Alice olhou ansiosamente para seu rosto para tentar ver o que se passava com ele. Não havia dúvidas de que ele tinha um nariz muito virado para cima, muito mais um focinho que um nariz de verdade: também seus olhos estavam se tornando muito pequenos para um bebê, Alice realmente não gostava do olhar da coisinha."Mas talvez ele esteja apenas soluçando", ela pensou, e olhou mais uma vez para seus olhos, para ver se havia alguma lágrima.

Não, não havia lágrimas. "Se você está se transformando em um porco, meu querido", disse Alice, seriamente, "eu não posso fazer nada por você. Entenda!" A pobre coisinha soluçou novamente (ou grunhiu, era impossível dizer o que, e os dois ficaram em silêncio por algum tempo).

Alice começou a pensar consigo mesma,"Agora, o que posso eu fazer com essa criatura, quando eu voltar para casa?". Nesse momento ele grunhiu mais uma vez, tão violentamente, que ela olhou para seu rosto alarmada. Dessa vez não podia haver nenhuma dúvida: ele não era nada mais nada menos que um porco, e ela percebeu o quão absurdo era ela carregá-lo para qualquer lugar.

Então, soltou a pequena criatura e percebeu bastante aliviada que ele fugiu calmamente em direção à floresta. "Se ele crescesse", continuou ela, "ia se tornar uma criança extremamente feia, mas vai ser um porco bonito, eu acho. "E ela começou a pensar em outras crianças que ela conhecia, que poderiam muito bem ser porcos, e estava justamente dizendo para si mesma "se apenas soubesse a maneira certa de mudá-los..." quando levou um pequeno susto ao ver o Gato de Cheshire sentado sobre o ramos de uma árvore a pouca distância.

O Gato apenas sorriu quando viu Alice. Ele parecia bem natural, ela pensou, e tinha garras muito longas e muitos dentes grandes, assim ela sentiu que deveria tratá-lo com respeito.

"Gatinho de Cheshire", começou, bem timidamente, pois não tinha certeza se ele gostaria de ser chamado assim: entretando ele apenas sorriu um pouco mais. , "Acho que ele gostou", pensou Alice, e continuou. "O senhor poderia me dizer, por favor, qual o caminho que devo tomar para sair daqui?"

"Isso depende muito de para onde você quer ir", respondeu o Gato.

"Não me importo muito para onde...", retrucou Alice.

"Então não importa o caminho que você escolha", disse o Gato.

"...contanto que dê em algum lugar", Alice completou.

"Oh, você pode ter certeza que vai chegar", disse o Gato, "se você caminhar bastante."

"Alice sentiu que isso não deveria ser negado, então ela tentou outra pergunta.

"Que tipo de gente vive lá?"

"Naquela direção", o Gato disse, apontando sua pata direita em círculo," vive o Chapeleiro, e naquela, apontando a outra pata, "vive a Lebre de Março. Visite qualquer um que você queira, os dois são malucos."

"Mas eu não quero ficar entre gente maluca", Alice retrucou.

"Oh, você não tem saída", disse o Gato, "nós somos todos malucos aqui. Eu sou louco. Você é louca."

"Como você sabe que eu sou louca?", perguntou Alice.

"Você deve ser", afirmou o Gato, "ou então não teria vindo para cá."

Alice não achou que isso provasse nada afinal: entretanto, ela continuou: "E como você sabe que você é maluco?"

"Para começar", disse o Gato, "um cachorro não é louco. Você concorda?"

"Eu suponho que sim", respondeu Alice.

"Então, bem", o Gato continuou, "você vê os cães rosnarem quando estão bravos e balançar o rabo quando estão contentes. Bem, eu rosno quando estou feliz e balanço o rabo quando estou bravo. Portanto, eu sou louco."

"Eu chamaria isso de ronronar, não rosnar", disse Alice.

"Chame do que você quiser", disse o Gato. "Você vai jogar críquete com a Rainha hoje?"

"Eu gostaria muito", respondeu Alice, "mas ainda não fui convidada."

"Você me verá lá", disse o Gato, e desapareceu.

Alice não ficou muito surpresa com isso, ela estava se acostumando com coisas estranhas acontecendo. Enquanto ela ainda estava olhando para o lugar onde o Gato estivera, ele reapareceu repentinamente.

"A propósito, no que se transformou o bebê?", perguntou o Gato. "Eu quase esqueci de perguntar."

"Transformou-se num porco", Alice respondeu calmamente, come se o Gato tivesse voltado da maneira mais natural possível.

"Eu pensei que ele iria", disse o Gato, e desapareceu novamente.

Alice esperou um pouco, meio que esperando vê-lo novamente, mas ele não apareceu, e depois de um minuto ou dois ela começou a caminhar na direção de onde foi dito que a Lebre de Março morava. "Eu já vi Chapeleiros antes", disse ela para si mesma, "a Lebre de Março será bem mais interessante, e talvez, como é Maio ela não estará delirante - pelo menos não tão loucamente como ela deve ficar em Março." Ao dizer estas palavras ela olhou para cima e lá estava o Gato novamente, sentado no galho de uma árvore.

"Você falou porco ou figo? (pig or fig)", disse o Gato.

"Eu disse porco", retrucou Alice, "e eu gostaria que você parasse de aparecer e desaparecer repentinamente: você deixa a gente tonta!"

"Tudo bem", disse o Gato, e desta vez ele desapareceu bem lentamente, começando pelo final do rabo e terminando pelo sorriso, que permaneceu por algum tempo depois do resto ter ido embora.

"Bem! Eu tenho visto muitos gatos sem sorriso", pensou Alice,"Mas um sorriso sem um gato! É a coisa mais curiosa que já vi em toda minha vida!"

Ela não tinha ido muito longe antes antes de avistar o que imaginou ser a casa da Lebre de Março: ela achou que deveria ser a casa certa porque as chaminés eram feitas com a forma de orelhas e o teto era coberto com peles. A casa era tão grande que Alice não queria se aproximar até mordiscar um pedaço da mão esquerda do cogumelo, e crescer para mais ou menos 70 centímetros: mesmo depois disso ela caminhou em sua direção timidamente, dizendo para si mesma: "Suponhamos que ela esteja delirante afinal! Eu quase desejo que tivesse ido ver o Chapeleiro!"


Capítulo V - Alice no país das maravilhas

Capítulo 5
Conselho de uma lagarta

A Lagarta e Alice olharam-se uma para outra por algum tempo em silêncio: por fim, a Lagarta tirou o narguilé da boca, e dirigiu-se à menina com uma voz lânguida, sonolenta.

"Quem é você?", perguntou a Lagarta.

Não era uma maneira encorajadora de iniciar uma conversa. Alice retrucou, bastante timidamente: "Eu - eu não sei muito bem, Senhora, no presente momento - pelo menos eu sei quem eu era quando levantei esta manhã, mas acho que tenho mudado muitas vezes desde então.

"O que você quer dizer com isso?", perguntou a Lagarta severamente. "Explique-se!"

"Eu não posso explicar-me, eu receio, Senhora", respondeu Alice, "porque eu não sou eu mesma, vê?"

"Eu não vejo", retomou a Lagarta.

"Eu receio que não posso colocar isso mais claramente", Alice replicou bem polidamente, "porque eu mesma não consigo entender, para começo de conversa, e ter tantos tamanhos diferentes em um dia é muito confuso."

"Não é", discordou a Lagarta.

"Bem, talvez você não ache isso ainda", Alice afirmou, "mas quando você transformar-se em uma crisálida - você irá algum dia, sabe - e então depois disso em uma borboleta, eu acredito que você irá sentir-se um pouco estranha, não irá?"

"Nem um pouco", disse a Lagarta.

"Bem, talvez seus sentimentos possam ser diferentes", finalizou Alice, "tudo o que eu sei é: é muito estranho para mim.

"Você!", disse a Lagarta desdenhosamente. "Quem é você?"

O que as trouxe novamente para o início da conversação. Alice sentia-se um pouco irritada com a Lagarta fazendo tão pequenas observações e , empertigando-se, disse bem gravemente:"Eu acho que você deveria me dizer quem você é primeiro."

"Por quê?", perguntou a Lagarta.

Aqui estava outra questão enigmática, e, como Alice não conseguia pensar nenhuma boa razão, e a Lagarta parecia estar muito chateada, a menina despediu-se.

"Volte", a Lagarta chamou por ela. "Eu tenho algo importante para dizer!"

Isso soava promissor, certamente. Alice virou-se e voltou.

"Mantenha a calma", disse a Lagarta.

"Isso é tudo?", retrucou Alice,engolindo sua raiva o quanto pôde.

"Não", respondeu a Lagarta.

Alice pensou que poderia muito bem esperar, já que não tinha nada para fazer, e talvez no fim das contas ela poderia dizer algo que valesse a pena. Por alguns minutos a Lagarta soltou baforadas do seu cachimbo sem falar; afinal, ela descruzou os braços, tirou o narguilé da boca novamente e disse: "Então você acha que mudou, não é?"

"Temo que sim, Senhora", respondeu Alice. "Não consigo lembrar das coisas como antes - e não mantenho o mesmo tamanho nem por dez muinutos!"

"Não consegue lembrar que coisas?", continuou a Lagarta.

"Bem, eu tentei recitar "Como a abelhinha estava atarefada, mas fiz tudo diferente!"

Alice replicou numa voz muito melancólica.

"Repita "Você está velho, Pai William", pediu a Lagarta.

Alice cruzou as mãozinhas e começou:

Você está velho, Pai Joaquim, disse o jovem,
E seu cabelo está ficando branquinho,
Mas você ainda planta bananeira,
Você acha, que na sua idade, isso está certo?
Na minha juventude, Pai Joaquim respondeu,
Tinha medo de perder a cabeça,
Mas agora eu sei que não posso perder,
Porque não paro de plantar bananeira e estou inteiro.
Você está velho, já falei uma vez, retrucou o jovem,
E está engordando demais,
Mas ainda entra aqui dando cambalhotas,
Por favor, como você faz isso?
Na minha juventude, disse o velho,
Eu me mantive em forma,
Usando esse ungüento - é bem baratinho,
Posso vender uns dois potes para você?
Você está velho, disse o jovem, e seus dentes estão fraquinhos
Para mastigar qualquer coisa dura.
Mas você ainda come um ganso com osso e tudo,
Por favor, como você faz isso?
Na minha juventude, disse o velho, eu acreditava na Lei,
E discutia tudo com minha mulher,
O treino que fiz naquela época,
Durou para o resto da minha vida!
Você está velho, disse o jovem, e ninguém pode acreditar
que você ainda enxerga bem.
Mas ainda assim você equilibra uma enguia na ponta do nariz.
O que deixou você tão esperto?
Já lhe respondi três perguntas, agora chega,
Disse o velho, e não pense que você me agrada!
Você acha que vou perder meu dia ouvindo suas bobagens?
Pode sumir, ou vai levar um pontapé no traseiro!

"Isso não está dito certo", disse a Lagarta.

"Não bem certo, eu receio", respondeu Alice timidamente, "algumas das palavras podem ter sido trocadas".

"Está errado do começo ao fim", afirmou a Lagarta decididamente. Então fez-se um silêncio por alguns minutos.

A Lagarta foi a primeira a falar.

"De que tamanho você quer ser?", ela perguntou.

"Oh, eu não ligo para qual tamanho", respondeu Alice apressadamente, "apenas um que não fique mudando sempre, a senhora sabe."

"Eu não sei", retrucou a Lagarta.

Alice não disse mais nada: ela nunca fora tão contradita em toda sua vida antes e sentia que estava perdendo a paciência.

"Você está satisfeita agora?", indagou a Lagarta.

"Bem, eu gostaria de ser um pouco maior, Senhora, se não se importar", disse Alice, "oito centímetros é um tamanhozinho meio pequeno demais."

"É um ótimo tamanho certamente!", vociferou a Lagarta,levantando-se enquanto falava (ela tinha exatamente oito centímetros de altura).

"Mas eu não estou acostumada com isso!", alegou a pobre Alice em um tom consternado .

"Você se acostumará com o tempo", retrucou a Lagarta, e colocou o narguilé na boca, começando a fumar novamente.

Desta vez Alice esperou pacientemente até a Lagarta querer falar novamente. Depois de um ou dois minutos a Lagarta tirou o cachimbo da boca, e bocejou uma ou duas vezes e espreguiçou-se. Então desceu do cogumelo e arrastou-se para longe, simplesmente observando, ao sair: "Um lado irá fazê-la crescer e o outro irá fazê-la diminuir."

"Um lado do quê? Outro lado do quê? ", pensava Alice consigo mesma.

"Do cogumelo", respondeu a Lagarta, como se Alice tivesse falado alto, e já no momento seguinte ela estava fora da vista.

Alice permaneceu olhando pensativamente para o cogumelo por um minuto, tentando compreender quais eram os dois lados da planta, e, como ela era perfeitamente redonda, sentiu-se em meio a uma difícil questão. Entretanto, afinal a menina esticou seus braços o mais que pôde em torno do cogumelo e cortou um pedaço da borda com cada mão.

"E agora, qual é qual?" disse Alice para si mesma, mordiscando um pouco da mão direita para sentir o efeito. No momento seguinte ela sentiu um violento golpe debaixo do queixo: ela batera no seu pé.

Ela estava muito assustada com esta súbita mudança, mas sentiu que não havia tempo a perder, pois estava encolhendo rapidamente. Alice colocou mãos à obra para comer do outro pedaço. Seu queixo estava tão fortemente pressionado contra seu pé, que não havia espaço para abrir a boca; mas ela conseguiu afinal, e esforçou-se para engolir um bocado da mão esquerda.

"Puxa, minha cabeça está livre afinal!", disse Alice num tom de prazer, que mudou para um tom alarmado no momento seguinte, quando ela descobriu que seus ombros não estavam em lugar nenhum à vista: tudo o que ela podia ver ao olhar para baixo era uma imensidão de pescoço, que parecia nascer como um caule sobre um mar de folhas verdes que se estendiam lá embaixo.

"O que podem ser todas estas porcarias verdes?", disse Alice."E para onde foram meus ombros? E oh, minhas pobres mãos, como é isso, eu não posso vê-las". Ela as estava movendo enquanto falava, mas parecia que não adiantava nada, exceto por um leve chacoalhar nas distantes folhas verdes.

Como parecia não haver chances de trazer suas mãos até a cabeça, Alice tentou levar a cabeça até elas e descobriu com *alegria que seu pescoço podia tombar facilmente em qualquer direção, como se fosse uma serpente. A menina estava justamente conseguindo curvar seu pescoço em um gracioso zigue-zague que a levaria a um mergulho nas folhas, que ela achava serem as copas das árvores sob as quais anteriormente vagueara, quando um agudo silvo a fez retroceder rapidamente: uma grande pomba voava contra seu rosto , e batia em sua faces com as asas.

"Serpente!", gritou a Pomba.

"Eu não sou uma serpente!", afirmou Alice indignadamente. "Deixe-me."

"Serpente, eu digo novamente!", repetiu a Pomba, mas em um tom mais moderado, e continuou, com um tipo de soluço, "Eu tentei de todas as maneiras, mas nada parece satisfazê-las."

"Eu não tenho a menor idéia sobre o que você está falando", disse Alice.

"Eu já tentei as raízes das árvores, já tentei as margens e já tentei as sebes", a Pomba continuou, sem prestar atenção em Alice. "Mas estas serpentes, nada as satisfaz!"

Alice estava mais e mais confusa, mas achou que não adiantava falar nada até a Pomba terminar.

"Como se não houvesse problema nenhum em chocar os ovos", disse a Pomba, "mas ainda tenho que ficar de olho nas serpentes, noite e dia! Eu não tirei uma soneca sequer nesses últimos três dias!"

"Eu sinto muito que a senhora esteja irritada", falou Alice, que estava começando a entender o que isso significava.

"E eu escolhi a mais alta árvore da floresta", continuou a Pomba, cuja voz se transformara num guincho, "e estava achando que estaria livre delas afinal, e elas precisam serpentear até no céu! Ugh, Serpente!"

"Mas eu não sou uma serpente, já falei!", insistiu Alice. "Eu sou uma...Eu sou uma..."

"Bem! O que é você?", perguntou a Pomba. "Eu posso ver que você está tentando inventar alguma coisa."

"Eu...eu sou uma menininha", disse Alice, um pouco em dúvida, pois relembrava o número de mudanças pelas quais tinha passado naquele dia.

"Uma história promissora, certamente1", disse a Pomba, com um tom do mais profundo desprezo. "Eu tenho visto muitas menininhas em minha vida, mas nem uma com um pescoço como este. Não, não! Você é uma serpente, e não há porque negar isso. Eu suponho que agora você vai me dizer que nunca comeu um ovo!"

"Eu já experimentei ovos, com certeza", respondeu Alice, que era uma menina que não mentia, "mas menininhas comem ovos tanto quanto serpentes, sabe."

"Eu não acredito nisso", disse a Pomba, "mas se elas comem, então elas são um tipo de serpente: isso é o que eu posso dizer."

Essa era uma idéia nova para Alice, ela ficou então um ou dois minutos em silêncio, que deu à Pomba a oportunidade de adicionar:

"Você está procurando por ovos, eu sei disso muito bem, então o que me interessa se você é uma menininha ou uma serpente?"

"Isso já é demais para mim ", falou Alice rudemente, "mas eu não estou procurando por ovos como parece; e, se estivesse, eu não iria querer os seus, eu não gosto de ovos crus."

"Bem, saia daqui, então", disse a Pomba em um tom amuado, e acomodou-se novamente em seu ninho. Alice agachou-se entre as árvores o melhor que pôde, pois seu pescoço enganchava-se nos galhos das árvores e de vez em quando ela precisava parar e livrá-lo. Depois de um tempo, Alice lembrou que ainda tinha pedaços de cogumelo em suas mãos, e pôs mãos à obra bem cuidadosamente, mordiscando de uma e depois de outra mão, e crescendo um pouco e encolhendo um pouco, até que conseguiu colocar-se em seu tamanho normal.

Fazia tanto tempo que ela não estava no seu tamanho normal, que sentiu-se um pouco estranha no início, mas acostumou-se em poucos minutos, começando a falar consigo mesma, como de costume: "Bem, metade do meu plano já está feito! Que estranhas todas essas mudanças são! Eu nunca tenho certeza do que vai acontecer, de um minuto para outro! Entretanto, eu voltei ao meu tamanho de sempre: a próxima coisa é entrar no lindo jardim - como é que isso vai ser feito, eu gostaria de saber?

Quando a garotinha disse isso, subitamente avistou um lugar descampado, com uma pequena casinha de mais ou menos um metros e vinte de altura.

"Quem quer que viva lá", pensou Alice, "acho que não seria apropriado entrar com esta altura. Posso assustá-los. "Então ela começou a mordiscar pedacinhos da mão direita novamente mas não se atreveu a chegar perto da casa até que chegar aos vinte e cinco centímetros de altura.